Meu nome é Neide Aparecida Malta Chaves, nasci em Carmópolis (MG) e trabalho há quinze anos na Escola Estadual Eliseu Laborne e Vale. Em meados da década de 60, o Sr. Inácio Andrade Melo cedeu um barracão para construir uma escolinha, porque o Grupo Professor Morais, muito frequentado por crianças do Jardim Montanhês, era longe. Para ir até ele, era preciso atravessar o Aeroporto, o que era perigoso. Então, abriram essa escolinha, que foi tendo uma extensão de séries. O Governador Magalhães Pinto, em 1970, mandou construir novas instalações no local onde seria a nova sede da escolinha, que recebeu o nome de 'Eliseu Laborne e Vale', em homenagem a um médico e político muito conhecido na época, que havia falecido há pouco tempo. O governador compareceu à inauguração da escola.
Para mim, é muito bom trabalhar com a comunidade, principalmente com a parte mais carente do bairro, que é o público da escola. Sendo diretora da escola, a gente acaba participando da Igreja, do posto de saúde, da comunidade como um todo. A maior dificuldade é trazer os pais para dentro da escola, porque eles não têm muito tempo, já que a maioria trabalha. Com isso, a gente acaba considerando os meninos como nossos filhos.
Eu vim para cá a pedido da ex-diretora, D. Efigênia, que ficou na direção da escola por 35 anos. Entrar no lugar de uma pessoa de 35 anos de trabalho não é fácil. Foi necessário fazer modificações porque as pessoas se acomodam, acostumam-se com a pessoa e até mesmo o próprio sistema educacional foi mudado. Tem horas que a gente fica mesmo se perguntando se as mudanças foram para melhor. Em 1997, houve uma mudança que foi a educação continuada. A escola passou de série para ciclo, com isso, o aluno parou de estudar. Vinha para a escola só com a mochila nas costas, como se fosse passear. Mas explicamos que a educação é continuada, mas a aprovação não é automática, que ele tem que estudar para ser alguém na vida.
Próximo ao bairro, há os colégios Padre Eustáquio e Frei Orlando, que são mais frequentados por quem tem um poder aquisitivo mais alto.
A escola atualmente
A escola Eliseu Laborne e Vale é uma escola tranquila. O relacionamento entre diretoria e funcionários é ótimo, muito aberto e flexível. A maioria das pessoas que trabalha aqui mora na comunidade, só falta ser comadre e compadre aqui dentro. Todo o mundo aqui é vizinho e gosta da escola, que é muito importante para o bairro. Aqui, há o projeto Proerd, da Polícia Militar de Minas Gerais, de prevenção a drogas. Os policiais ficam atuando por seis meses dentro da escola, fazendo um trabalho de prevenção às drogas com crianças de dez anos. Há, também, o projeto 'Semeando', do Sesiminas, que ensina a plantar horta e a fazer jardins. Com isso, temos uma escola mais criativa. Dá trabalho, mas não se pode mais ter aquela escola da década de 60, em que o aluno tinha que aceitar tudo o que fosse falado. Nós queremos o aluno questionador, que sabe pensar, que quer saber o por quê.
Para mim, é muito gratificante trabalhar aqui. É um trabalho árduo, mas a escola é bem conceituada, tanto que existe lista de espera por vagas. Com certeza, ela é muito importante para os professores, para o bairro e para os alunos, que são a razão de sua existência. Nosso objetivo é o aluno. Ele está em primeiro lugar.
Lembranças do Jardim Montanhês
Não nasci no Jardim Montanhês, mas foi por puro acaso: minha mãe, quando estava grávida, foi passear em Carmópolis (MG) e acabei nascendo por lá, em 22 de março de 1955. Só fui lá para nascer e voltei e, por isso, me considero belorizontina. Morei na rua Estevão de Oliveira, 177, no Jardim Montanhês, minha vida inteira. Casei-me e continuei morando lá, não conheço outro lugar.
Minha infância no bairro foi ótima. A avenida Pedro II era um córrego, nossa área de lazer era a rua, onde a gente brincava de finca, de jogar tapão e de queimada no Aeroporto, nos domingos inteirinhos. Havia, também, o campo do Palmeiras, onde os times do bairro e de outros lugares jogavam. Era o divertimento da gente assistir aos jogos, até mesmo na adolescência, para ver os rapazinhos jogando. Na minha casa, havia abacateiro e eu vendia os abacates de casa em casa. Meu irmão vendia laranjas no campo. Ele morria de vergonha, então eu ficava do lado dele, para ele poder vender. Era uma época difícil. Roupa nova era só de ir à Missa. Nós tínhamos só um sapato. Não tinha como ganhar outro. O bairro todinho era assim, o pessoal era muito humilde.
Na igreja, que fica perto da minha casa, havia o grupo de jovens Gav - Grupo Ação e Vida, e o Gavinho. Minha irmã mais velha participava do Gav e, os mais novos, do Gavinho. Os encontros aconteciam aos sábados, na Igreja Santa Margarida Maria Alacoque, e tínhamos o apoio do Padre Henrique. Nessa época, tinha "Horas Dançantes", que começavam às sete e terminavam às onze da noite. De lá, a gente ia embora para casa. Com a turma, também costumávamos fazer passeios, principalmente no zoológico e nas fazendas que existiam perto do bairro. Geralmente, a gente ia a pé, porque ônibus só havia um, que passava na parte de cima do bairro e ia até o centro, passando por uma ponte.
Quando tinha exposições no Parque da Gameleira, a gente ia a pé, levava merenda e não havia violência nenhuma. Eram grupos de rapazes e moças que ficavam na esquina, nas portas das casas conversando, com a maior liberdade.