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Depoimentos

Enviado por marina em 16/08/2012 14:20:00 ( 5577 leituras )

Meu nome é Osias Ribeiro Neves. Eu também sou do Jardim Montanhês, lugar em que nasci e vivi até meus 28 anos. Sou o segundo filho dos onze do casal Raymundo Cândido Neves e Izabel Ribeiro Neves. Meu avô Alípio Ribeiro da Silva veio de Oliveira com suas três filhas menores e comprou um lote na vila em 1932, na atual Rua Estevão de Oliveira, onde sua filha Ambrozina já morava. Depois outro filho seu, tio Eurípedes (Didi), comprou o terreno acima na esquina da Rua Lorena e naquele quarteirão chegou a morar todos os seus filhos, Ambrozina, Otávio, Didi, Francisca (Chica), Maria (Lia) e minha mãe Izabel. Franklin, casado com tia Ambrozina fazia corretagem de imóveis para o Inácio, conhecido por Inacim filho do Alípio de Melo, dono de todas aquelas áreas que estavam sendo desmembradas da fazenda São José que comprou em mil oitocentos e alguma coisa, na época que estava nascendo a cidade de Belo Horizonte.

 

Eu lembro que minha casa era um pequeno quintal com um pomar à frente do barracão que meu avô construiu para morar com a sua família. Minhas tias me contaram que ele era um mestre de obra bem sucedido em Oliveira, construtor de fazendas na região, tinha muitos empregados e um caminhão.  Minha avó Anicésia adoeceu de câncer e ele para tratá-la foi vendendo o que tinha. Ela faleceu em 1930 em Belo Horizonte e o único bem que ficou foi a casa que estava no nome dela em Oliveira e que por determinação do juiz, meu avô só podia vender para comprar outro imóvel e em nome das três filhas menores, Tia Chica, Tia Lia e mamãe. Assim ele fez, comprando o lote no Jardim Montanhês.  Contam também que um dos motivos de sua saída de Oliveira teve um viés político, ele havia apoiado o partido comunista e muita gente por isso decidiu não mais lhe dar serviço e ele então, veio para a capital.
Tempos depois a minha mãe se casou e meu avô fez um barracão de dois cômodos ao lado do seu no mesmo lote e a Tia Chica fez outro barracão na parte de baixo do lote, na parte que lhe cabia. Lembro-me de morar lá com minha irmã mais velha a Anicésia, a mais nova que eu a Neli e o Osmar, que até hoje lembro do seu nascimento. Minha mãe conta que nasci noutro lugar, num barracão alugado em frente a nossa casa na mesma rua.


Arte no Montanhês  
Não sei porque mas o bairro tem uma ligação com a arte. Muitos músicos, compositores, escritores e artistas da bola. Meus irmãos quase todos pintam e desenham. O Osmar fez Guignard, o Odair montou uma oficina, ele faz esculturas lindas em madeira, bonecas e ecojóias e há 4 anos voltou a morar no Jardim Montanhês, desta vez na rua Lorena. O Olavo é um artista, pinta muito bem, trabalha com marcenaria.
Muitas vezes o lugar e a família determinam muito o quê você vai ser. Na minha família, por exemplo, eu descobri muito depois que meus tios, irmãos da minha mãe, tocavam clarineta, flauta, bandolim entre outros. Nunca os vi tocar, mas tive o privilégio de ver minha tia tocar bandolim, que recebi de presente do meu pai aos dez anos. A família da minha mãe era de músicos que se reuniam em Oliveira para saraus na casa de meus avós.  Quando eu comecei a mexer com música eu achei que eu tinha inventado aquele negócio na minha família e não era.
Na minha rua sempre tinha brincadeiras à noite. Na época não havia televisão, então a gente brincava de contar histórias. As pessoas tinham por hábito contar histórias nas portas da casa ou nas conversas durante as visitas. Brincávamos também de auditório, eu imitava Cauby Peixoto, Nelson Gonçalves e Anísio Silva. Meu primo Paulo, que morava um pouco abaixo da minha casa, que era bem mais velho, tinha um grande acervo de Long Play e uma radiola Hi-Fi automática que tocava discos em 78, de 45 e de 33,3 rotações. Ele tinha Nat King Cole, Nelson Gonçalves, Bienvenido Granda, um artista cubano, cantador de boleros e dono de uma voz maravilhosa.  Lá em casa tinha um rádio valvulado, de quatro ponteiros e era a nossa diversão à noite ficar ouvindo as rádios Mayrink Veiga, Inconfidência e Nacional.
Minha mãe nos incentivou a improvisar um auditório em nossa casa. Colocava uma cadeira atrás do guarda roupa dela que dividia seu quarto com o nosso e ali, eu e minhas irmãs Anicésia e Neli, subíamos na cadeira para cantar pra ela e para o papai. Eu tentava cantar como Nelson Gonçalves ou Cauby Peixoto e elas imitavam Ângela Maria, Dalva de Oliveira e Emilinha Borba, artistas que estavam na mídia. Eu, mesmo não tocando nenhum instrumento musical, já gostava de inventar música sem saber sequer que aquilo já era um exercício de composição que eu me enveredaria tempos depois. Eram músicas originas que não sei de onde vinham, com letras improvidas, sem nexo, que ia fazendo com o nome de coisas que via no dia a dia. Depois esquecia, outras vezes conseguia até mesmo repetir a mesma coisa que havia improvisado.
No final da década de 60, mudou para o bairro a família Melquíades que fez uma casa onde ficava uma bela mangueira, na esquina da Rua Belo Vale com Rua Lorena, local de reunião da molecada da vila. O Carlinhos Melquíades tocava no violão umas poucas músicas e ainda fazia a marcação do baixo com a boca. Era a era do rock, dos Beatles, Roberto Carlos e companhia. O violão e a guitarra se popularizaram nas mãos da juventude e, no Jardim Montanhês, não foi diferente. Entre outros da minha idade, também decidi comprar um violão e aprender a tocar ainda que sozinho. Comprei um método do Paulinho Nogueira e passei a me dedicar ao violão, principalmente nos finais de semana e à noite, depois da aula. Nisso, minha irmã Anicésia, com sua bela voz e afinadíssima, me apresentou o Chico Buarque, cantando uma de suas músicas e naquele momento em que estava mais ligado no rock debandei para a MPB.  Era a volta às raízes, pois bem antes disso, aos 8 anos de idade, eu cantei à capela num palanque da prefeitura armado na minha rua numa festa beneficente promovida pela minha tia Ambrozina. Imitei Cauby e ganhei por prêmio uma garrafa de Pepsi-cola. Na vila tinha disso, muitas festas e nelas, programas de calouros com direito a prêmio ou a ser “gongado”.

 

Adolescência
Meu negócio era jogar futebol e essa era a minha paixão. Tudo na minha vida girava em torno do futebol. Sempre fui apaixonado pela bola, jogava sábado e domingo e, às vezes, à noite quando havia iluminação. Eu já joguei bola com oito pontos no pé de tão fominha que era. Eu jogava de ponta esquerda, de ponta direita e de lateral.  Joguei no Olaria, Imperial, Palmeiras, Prudentina, Grêmio Mariano Esportivo, Estrela Solitária, Deringondé e Nacional Atlético Clube. Não era o que se podia chamar de craque na época, era bom de bola e estava sempre escalado no primeiro time. Craques, de que me lembro na época eram O Sarampo, do Imperial; O Pedrinho, o Lima e o Pelé, do Palmeiras; o Zinho, do Estrela Solitária; o Alemãozinho, o Fonseca e o Ênio, do Grêmio; O Zé Luiz Sandinha que jogava aqui e ali; os irmãos Raimundo goleiro, o Zé baiano, Zé pescoço, do Olaria e uma dupla fenomenal que eram os primos Taquinho e Guininho que infernizavam a vida dos adversários com jogadas arrojadas e belas. Eles jogaram em muitos times, entre eles no Olaria, mas no Estrela Solitária fizeram fama. Havia muitos craques da pelota naqueles campos de várzea da região.    
Quando eu tinha uns quinze anos, me interessei pela leitura. Na minha casa não tinha um livro, tinha gibi que eu adorava. Meu pai não lia, tinha apenas o terceiro ano primário, minha mãe adorava ler, mas não tinha livro, ela vivia relendo um livro de medicina que meu tio Otávio, que já não andava bem da cabeça, havia deixado com ela. O primeiro livro lá em casa fui eu quem comprou. Um dia uma namoradinha me emprestou um livro pra ler e achei aquilo o máximo porque descobri que as pessoas liam sem serem obrigadas pelas escolas. O livro era Sidarta, de Herman Hess e eu achei bom demais e a partir daí passei a substituir os gibis por livros. Comprava livro, pegava emprestado, trocava e ia a bibliotecas, uma delas a do Sesc no centro, na Rua dos Tupinambás próximo a Casa Paraná, local em que eu trabalhava como Office-boy.
Depois, com o grupo de jovens, me entrosei com o pessoal do seminário e passei a usar a biblioteca de lá também, pegava vários livros emprestados, muitos deles sob a orientação do seminarista Círis Silva, uma espécie de tutor que eu tive. Comecei a ler filosofia, psicologia, depois enveredei para os romances. No dia em que Machado de Assis caiu em minhas mãos, por intermédio da minha namoradinha, eu achei que tinha descoberto o mundo. A melhor coisa que eu já tinha lido na minha vida.

 

Grupo de Jovens
Um dia apareceu no Jardim Montanhês um pessoal que tinha se mudado para lá recentemente e morava no final do bairro, atualmente denominado Jardim Alvorada. Eles estavam tentando montar um grupo de jovens. Certo domingo, depois da missa na Capela de Santa Maria Salomé, a única igrejinha do bairro, eles conversaram com cada um de nós ali presentes. Muitos da nossa turma de futebol migraram, juntamente com outros, para o grupo de jovens e isso mudou a minha vida e a de outros. Uma das fundadoras do grupo foi a Terezinha Renna, uma líder nata e uma comunicadora de primeira. Com ela estavam também o seminarista Círis Silva e o padre Henrique, figuras de grande importância para aquela comunidade. Havia ainda outros seminaristas, o Pedro e um japonês, o qual me esqueci o nome. Essas pessoas fundaram o GAV – Grupo de Ação e Vida.  O GAV uniu os jovens dos quatro cantos do bairro. As discussões mudaram de nível, deixaram a tecla única e viciada do futebol e o meu leque de amigos se abriu e me liguei a outras pessoas com interesses diferentes. Nós começamos a mexer com teatro, com música, muitas festas, trabalhos sociais, chegamos a comprar lotes e a fazer casas em regime de mutirão para pessoas sem lugar de morar e ainda, programas de alfabetização de adultos, utilizando método de Paulo Freire. Editamos um jornalzinho chamado “Presença”.  Isso foi em 67, 68, em plena ditadura, naquela efervescência cultural. O GAV tinha outros músicos, o próprio Círis que tocava violão e escaleta, o Rone tocava violão e contrabaixo, o Lúcio Fonseca que chegou depois e que além de ser bamba no violão, era um intelectual. Veio também o amigo João Bernardino (João Grandão) que já tocava contrabaixo na noite de BH e quem me ensinou as primeiras lições de violão.
Os seminaristas que se mudaram para o Jardim Montanhês faziam teologia na Católica, na Avenida Augusto de Lima ao lado da Igreja São Sebastião e, como eles estavam muito envolvidos com a política estudantil, a gente acabou se envolvendo também. Não o grupo todo, mas algumas pessoas, principalmente eu e o Osmar Andrade Alves. Nessa época, os padres franceses da escola foram presos, entre eles o Michel, que está hoje na UFMG. Eles foram expulsos do país como subversivos.

 

Estudo e trabalho
Minha história escolar é muito zoneada, eu comecei a estudar e parei muitas vezes porque eu não tinha grana para pagar. Eu tinha que trabalhar o dia inteiro para ajudar em casa. Eu comecei a trabalhar com nove anos com meu pai, ajudando na construção civil, aprendendo ofício de bombeiro hidráulico. Fui engraxate de caixa e tudo na porta do Bar do Sapo na Av. Pedro II e depois virei balconista do mesmo bar, vendendo cachaça e cerveja. Depois fui trabalhar de sapateiro, aprendi o ofício de fazer e vender sapatos. Trabalhei em lojas de ferragens, uma que não me lembro o nome na Av. Augusto de Lima, na Casa Paraná,  trabalhei na fábrica Molas Santos no bairro Jardim América, aprendi datilografia e fui trabalhar em escritórios, primeiro como apontador numa pequena construtora, depois no Consórcio Mineiro de Administração, uma imobiliária e quando passei no vestibular estava novamente na Casa Paraná e em seguida foi para a Líder Louças e Ferragens. Quando saía de um emprego e não podia ficar parado, voltava a trabalhar em obras como bombeiro, muitas vezes com o meu pai.
Então era uma irregularidade muito grande na escola. Parava de estudar, largava, começava, retomava, até que fui para o Colégio Padre Eustáquio retomar o colegial. Mas chegou no terceiro ano colegial, eu perdi o emprego que eu tinha na fábrica de molas. Lá eu ia de ônibus e voltava a pé da Rua Cercadinho com Rua Santos no Jardim América até o Colégio que ficava ao lado da Igreja de Padre Eustáquio, então eu sempre chegava atrasado na escola que era longe da fábrica. Quando perdi o emprego eu não consegui mais pagar a escola porque os dois últimos meses que trabalhei eu não recebi. Fui conversar com o Frater Inocêncio que era o diretor e ele me disse: “se você não pagar você não faz prova final e você não passa de ano”. Aí ficou o impasse, o frater Cristino interferiu, mas o frater Inocêncio estava irredutível. Então eu que era muito atrevido falei com ele: “se eu não fizer prova eu não pago e saio do colégio”, e, foi assim que parei de estudar outra vez.
No ano seguinte fui fazer o supletivo de hoje, que na época se chamava Madureza. Quando fui fazer inscrição no curso, o Sodré, um dos professores e sócio do Curso Itamarati me disse que o Artigo 99 me permitia fazer segundo grau sem terminar o primeiro e aí eu fiz. Encarei o supletivo de segundo grau sem ter o primeiro grau completo. Por causa disso eu tinha que fazer provas em regime estadual e federal. As primeiras provas que eu fiz eram em Montes Claros, porque lá era a região federal. Um grupo grande do Curso Itamarati foi fazer prova lá. Eu fiz prova de História e Português e eu não sabia que tinha prova escrita e oral. A prova de Português era uma prova escrita, uma prova oral de gramática e uma prova oral de literatura. Eu não sei como é que eu passei.
Depois disso cismei que ia fazer Jornalismo e entrei num cursinho na Casa do Estudante Mineiro. Aí eu pedi demissão do emprego que eu tinha, paguei o cursinho até o final do ano, isso foi em agosto, e fiquei estudando o dia inteiro e ia para a aula à noite. Aí fiz o vestibular na Federal tomei pau, fiquei por um ou dois pontos.  Aí voltei para o meu emprego na Casa Paraná e jurei não mais estudar. Fiquei o ano inteiro sem estudar nem um dia.
No penúltimo dia de inscrição meu amigo Danilo foi ao meu trabalho me convencer a fazer inscrição para o vestibular na federal e, como eu disse que não faria, ele também desistiu e viajou para Lafaiete. No dia seguinte, último dia de inscrição, a Dorinha, uma morena linda, doce e inteligente que era chefe de pessoal da Casa Paraná que tinha um carinho especial comigo e eu por ela, me convenceu a fazer o vestibular. Eu disse que não tinha dinheiro e ela me levou no dono da loja, Sr. Manoel I e disse que eu não ia fazer a inscrição porque não tinha dinheiro. Aí ele perguntou: “quanto é a inscrição? Eu pago a inscrição dele”. Aí ela pegou o dinheiro, foi comigo tirar retrato e me levou ao Palácio das Artes para fazer a inscrição. Cheguei lá com a ideia de escolher entre Letras, Jornalismo, Engenharia e Sociologia, esse último curso se chamava Ciências Sociais pelo qual me decidi aos 22 anos de idade. E, quem mais me influenciou a cursar sociologia foi o Geraldo Élvio, na época estudante de Sociologia da UFMG, meu professor no Curso Itamarati a quem devo um grande favor porque lá fiquei três meses sem pagar e ele e o Magela não me deixaram sair. Fiz o vestibular e passei.


Faculdade
A primeira sensação que eu tive na UFMG foi de um peixe fora d’água. Porque quem estava lá dentro era a elite, não encontrei gente como eu de origem operária, no meu curso, provavelmente eu era o único. Para ir para a Fafich eu pegava dois ônibus. Levantava às 5:30, saía de casa seis e pouquinho pegava um ônibus até o centro e outro para ir para o Santo Antônio. No início o curso era à noite e continuei trabalhando no mesmo lugar, nessa época trabalhava na loja Louças e Ferragens Líder, na avenida Paraná. No ano seguinte, o curso passou a ser de manhã e eu consegui convencer meus patrões a pegar serviço ao meio dia e ia até sete da noite. Eu trabalhava no balcão e ganhava meio salário mínimo mais a comissão sobre as vendas. Aí eu combinava com os clientes para me procurarem na parte da tarde, afinal eu era comissionado. Mas a situação ficou insustentável para a loja, fui despedido e fui viver de estágio. O primeiro estágio foi na Reitoria, depois comecei a pegar uns bicos com processamento de dados, digitação, à noite, das sete às duas da manhã para o Bradesco. Ainda eram computadores sem memória, com fitas cassetes, uma de um lado e outra de outro. Muitas vezes, nos finais de semana pegava um bico com serviços de bombeiro com o meu pai.

 

 

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Carteira de identidade estudantil de Osias Ribeiro Neves, emitida pelo DCE da UFMG
 
Na faculdade outra coisa importante para mim foi a Revista Literária. Já no primeiro ano, faturei o primeiro lugar em poesia com o poema Esfinge. No mesmo ano ganhei o primeiro lugar no Festival de Música em Belo Horizonte, promovido pelo Sesc. No ano anterior havia ganhado o segundo lugar. Ao todo, naquele ano ganhei em dinheiro o equivalente a 30 salários mínimos, ou seja, havia ficado rico porque para receber tanto dinheiro no ritmo que estava teria que trabalhar 30 meses. Com os prêmios fiz uma reforma no banheiro da casa da mamãe, pintei a casa toda e fiz a minha primeira viagem para a praia, passei três dias em Nova Almeida, no Espírito Santo. Depois disso, entre os anos de 1973 a 1977 ganhei outros prêmios literários, outro primeiro lugar em poesia na Revista Literária da UFMG, um terceiro lugar em contos e duas menções honrosas e prêmios no Rio de Janeiro, em Goiânia e na Paraíba, além de outros festivais de músicas, um deles em Congonhas com a música “Amanhando” que havia ganhado o festival em Belo Horizonte. Nesse período, esses prêmios me permitiram ter uma situação mais confortável.
Na Fafich, em 1975, montamos um grupo de música chamado Anonimato. De fato, o Anonimato era a união de dois lados da cidade de Belo Horizonte, o Jardim Montanhês representado por mim, pelo João Grandão e pelo João Planeta que era do Padre Eustáquio e o bairro Primeiro de Maio, de onde vieram o Matusalém, o Gil da Mata e o Júlio Gomes. Outros músicos-compositores chegaram depois, o Darlan Matos Cunha, o Sidney e o Ladston do Nascimento. Passaram pelo grupo outros músicos como o Lelé Xisto e a grande Ângela Maria Maciel, que com sua bela voz interpretou muitas músicas minhas em festivais. O Grupo Anonimato era formado essencialmente por compositores e marcou a música mineira. Foi o primeiro grupo em Belo Horizonte a tocar somente músicas inéditas de autoria de seus membros e, com isso e pela força de suas letras, tornou-se um dos preferidos pelo movimento estudantil que lhe garantia um bom público em todas as apresentações.

 

 

 

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Osias do Anonimato. Ensaio no DA da Fafich, em 1975.
 

 

 

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Grupo Anonimato, composto por moradores dos bairro Jardim Montanhês e Primeiro de Maio. Em pé, da esquerda para a direita: João Planeta, Matu, Osias, Ladston Nascimento e Júlio Gomes. Em baixo, da esquerda para a direita: João Grandão e Gil da Mata.

 


Amizades
Na época de Madureza eu conheci o Danilo, que escrevia poesia e que se tornou um grande amigo, amizade essa que cuidamos ao longo dos anos e que até hoje nos emociona, porque ainda que muitas vezes afastados, sabemos que podemos contar um com o outro em qualquer situação. O Danilo andava muito com o Wander e o Wander tinha um grupo chamado “Os tartes”, que era um grupo muito bom de rock progressivo que participava de um movimento chamado “Zorra”. O Wander era contrabaixista e ele era vizinho do Danilo, eles eram amigos e faziam música. Coincidentemente, o Wander era primo do Rone que morava na minha rua, que tocava violão e contrabaixo comigo quando participava dos festivais. Danilo dos Santos Pereira, mais que amigo até hoje, tornou-se meu parceiro de música. Eu fazia as músicas e ele botava as letras. Temos muitas parcerias, algumas delas gravadas pela Titane no disco Arraial e no disco do Oscar Neves, meu irmão. 
Outro grande amigo meu é o Eugênio Gomez que também morava no Jardim Montanhês. Foi através do Eugênio que eu conheci a Revista Literária. Ele já era universitário e havia sido premiado na Revista. A convivência com o Eugênio foi importantíssima para mim. Em termos de música ele tinha um dom incrível para compor e era também, assim como seu pai, Sr. Manoel, um intelectual. Meu nível cultural melhorou muito com a convivência com ele e com sua família, eu pegava muito livro emprestado com ele. Ele era mão aberta, me dava livros, entre o Rei da Vela e me aplicou romances importantes como o Judas, o obscuro, de Thomas Hardy. Nos tornamos parceiros, fiz algumas letras para músicas dele e ele para as minhas. Mais tarde, em 1984, gravamos o disco Arraial, um LP com músicas de nossa autoria.
Depois que me casei em 1976, me mudei do Jardim Montanhês e já morei em vários lugares. Minha família permaneceu morando no mesmo endereço até 2008 quando a minha mãe ficou praticamente sozinha depois da debandada dos filhos e do falecimento de meu pai. Durante o tempo em que ela morava no Jardim Montanhês continuei a ir lá semanalmente e mais que isso, parafraseando o Sr. Manoel Gomez, pai do Eugênio, da Denise, do Edmundo e da Yara Novaes, “Eu também sou o Jardim Montanhês.”

 

Depoimento cedido em 16/08/2012

 

Ouça a música 'Ai de mim solidão', do álbum Arraial (1984), de Osias Ribeiro Neves.

 
Ai de mim solidão
(Osias Ribeiro Neves)

Já te quis
solidão
hoje eu não
sou mais capaz de ti.

Ai de mim
solidão
se hoje eu não
sou mais a fim de ti

Ah! meu arraial
leve capinzal
lua mais redonda de cristal
boiam pelo céu
desta capital
luzes de neón
mas tanto faz
olho a noite...
há tanto disco voador
no céu desta cidade...

Arranjo e violões: Gilvan de Oliveira
Baixo: Gilberto Diniz
Percussão: Gilson Batista
Harmônica: Marcelo Antônio Batista
Sintetizador Yamaha: Guilherme Fernando Sabino Santos
Voz: Titane

 

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