Sou Maria das Dores Furiati. Nasci em Ubá, em 28 de junho de 1935. Depois que me casei, fui morar em São João Nepomuceno. De lá, mudamos para Belo Horizonte, em 1960, onde a gente teria mais campo e oportunidade de trabalho, além de ser melhor para os filhos. No ano seguinte, fomos para o bairro Jardim Montanhês, com os dois primeiros filhos. Nessa época, eu tinha 24 anos. Na nova cidade, tivemos mais dois filhos.
Meu marido começou a trabalhar em sociedade com meu cunhado, numa loja no bairro Padre Eustáquio. Depois de um tempo, os negócios não deram certo e ele passou a trabalhar como vendedor em uma empresa de eletrodomésticos e móveis. Muitas vezes, ele tinha que ir para o interior, para vender.
Quando cheguei no bairro, não tínhamos energia elétrica nem esgoto. As ruas eram muito esburacadas e tínhamos água na cisterna. Era um bairro muito atrasado. Hoje, tem muito prédio e o bairro melhorou demais mas, naquela época, era mais fácil de a gente lidar e comunicar com os vizinhos.
Para quem vem do interior, com criança pequena, chegar em cidade grande é muito diferente, mas a gente venceu. Eu acabei tendo que trabalhar. Era monitora de corte e costura, num lugar em frente à minha casa. Tinha muita procura de alunas e muita gente passou na minha mão - mocinhas e senhoras. Eu sempre gostei de costura, desde pequena. No interior, havia muitas pessoas que me ajudavam. Era corte e costura para todo o lado. Já minha mãe não era costureira. Hoje eu costuro, mas é na hora que posso. Compromisso mesmo eu só tenho com a paróquia Santa Margarida Maria Alacoque, onde dou aulas de costura para mães da Vila São José.
Quando nós chegamos aqui, não conhecíamos ninguém. Era tudo novidade, mas a gente foi conquistando a amizade do pessoal, ficando mais íntimos das pessoas, como o casal Pierre e Aparecida, que sempre trabalhou na Igreja. Muitos dos padres que passaram por aqui são amigos da gente, como os padres Reinaldo, Marcus Vinícius e Lúcio. De importante mesmo, o que a gente construiu no Jardim Montanhês foi muita amizade e confiança.
Igreja
Quando Dom Serafim veio visitar a nossa paróquia, escrevi uma carta que trazia a história da fundação da Igreja de Santa Maria Margarida Alacoque, criada pelos padres da Congregação dos Sagrados Corações de Jesus e Maria. Eles ficaram por 30 anos na paróquia, mas tiveram que entregá-la à Arquidiocese porque eram poucos padres e eles atuavam em vários lugares.
Para arrecadar dinheiro para a construção da Igreja, eu fazia almoço para 300 pessoas e o pessoal se reunia e organizava gincana com os jovens, rifas e festas juninas de maio a julho. Não foi fácil terminar essa construção, que durou um bom tempo.
Sorteio de um carro para arrecadar dinheiro para a construção da Igreja do Chapéu
As festas juninas acabaram virando tradição. Até hoje fazemos a festa, e sou eu quem faz os pastéis. Muita gente nova participa da organização, mas ainda há pessoas que são do início da nossa luta.
Encontro de casais
Eu e meu marido costumávamos participar de encontros de casais com a família. Era um grupo de casais que dava encontro de noivos, trabalhava com famílias e organizava retiros, na época dos padres dos Sagrados Corações. Atualmente, a comunidade Chemin Neuf, que atua na paróquia, continua realizando esses encontros, mas de uma forma diferente. Acho que agora é mais levado para a espiritualidade. Na época que eu e meu marido participávamos, nós tínhamos encontros de lazer, passeios e reflexão. Até mesmo os filhos participavam. A gente ia para o zoológico, para o parque Mangabeiras ou para algum sítio, buscando um entrosamento maior entre a família, uma comunhão maior entre os membros. Era uma coisa muito boa.
Corte e costura
Sou católica desde que nasci e nunca mudei de religião. Durante muito tempo, nós, moradores do Jardim Montanhês, frequentamos a Igreja do Bairro Padre Eustáquio ou o Convento das Carmelitas, pois não possuíamos uma paróquia própria até que fosse construída a Igreja do Chapéu.
Eu sempre fiz parte da Igreja, e acabei sendo convidada por Padre Sérgio para começar um trabalho na equipe pastoral. Ele sabia que eu tinha uma participação muito ativa na Igreja e também sabia da minha profissão de costureira, que eu pratiquei por toda a vida. Eu aceitei e, desde então, faço um trabalho ensinando costura a mães da Vila São José, cujos filhos participam da Pastoral do Menor. Elas também participam uma vez por mês de reunião de orientação e de culinária.
Quando começamos o trabalho, as mães chegaram com todo o esforço e eu as ensinava a tocar a máquina, a tentar fazer uma costura mais reta, mas tudo de acordo com as condições delas. Eu estou ajudando-as a dar um passo, mas esse passo demora muito. Cheguei à conclusão de que esse é um trabalho de paciência, mas que traz resultados positivos, de muita ajuda para elas. Se elas têm alguma dificuldade, elas chegam e me contam, já que adquiram muita confiança em mim. É um trabalho quase de mãe para filha. Outra pessoa me ajudava nessa atividade, mas desistiu por causa da lentidão e da demora dos resultados. Eu faço com muito amor, e qualquer resultado que aparece é motivo de alegria. Por exemplo, quando uma delas chega e fala que já está consertando roupas na vila e ganhando uns trocadinhos. Isso é uma beleza, já é alguma coisa para quem não sabia nada, nem tocar a máquina. Elas ganham autoconfiança. São coisas pequenas para mim, mas que, para elas, são grandes.
História da paróquia Santa Margarida Maria Alacoque
Carta escrita por D. Maria Furiati ao Cardeal Arcebispo de Belo Horizonte, Dom Serafim Fernandes de Araújo
"Excelentíssimo Cardeal Arcebispo de Belo Horizonte, Dom Serafim Fernandes de Araújo, nosso grande pastor, permita-nos dizer, amigo,
Seja muito bem-vindo. Sinta-se em sua própria casa. É com imensa alegria que damos graças a Deus pela vossa presença aqui hoje, vivendo este dia conosco. Para nós, comunidade de Santa Margarida Maria Alacoque, que estamos experimentando a honra de tê-lo aqui, abrindo a novena e os festejos de nossa padroeira, certamente trazendo para nós o exemplo de vosso dinamismo, vossa fé de homem que vive a esperança há de ser para nós um momento forte de transformação, compromisso e doação para a construção do Reino. Dom Serafim, nossa paróquia foi inaugurada em 1966, sob as bênçãos de Deus, pelas mãos do nosso querido, hoje, Bispo hemérito, Dom João Rezende Costa, e entregue à responsabilidade da congregação dos Sagrados Corações de Jesus e Maria, que permaneceu aqui por mais de 30 anos. Primeiramente, foi construída a Casa de Formação, que abrigou muitos seminaristas, entre eles padre Lúcio Drumond, hoje provincial, e Dom Luiz Mancília, Bispo de Cachoeiro de Itapemirim. Ordenaram aqui padre Marcus Vinícius Maciel, filho de nossa comunidade, nascido e criado no nosso meio, e padre Thiago, um holandês, pessoa de palavras firmes, homem que sabia colocar as mãos na massa, dirigiu a construção do salão, onde eram realizadas todas as celebrações, reuniões e encontros. Nosso primeiro pároco, Padre Vicente da Rocha Diniz, foi quem colocou e abençoou a pedra fundamental da Igreja. Aí, começou a construção da Igreja viva, comunidade de fé. Padre Gregório Pettri, que começou seu trabalho pastoral aqui, quando ainda era seminarista, recém-ordenado, foi nomeado pároco aqui, jovem determinado, aberto aos desafios, soube conquistar um grupo de famílias, jovens e, por fim, a comunidade, que deram tudo de si para a construção desta Igreja. Foi com muita luta, fazendo barraquinhas, almoços, sorteando carros, gincanas com a participação dos jovens. Por fim, por volta de 1973/1974, foi inaugurado nosso tão esperado templo. Desde então, até 1997, cerca de 14 padres dos Sagrados Corações passaram por aqui. Foi quando a paróquia foi entregue à Arquidiocese. Em 1998, foram nomeados padre Ivan Eustáquio de Souza e padre Leonardo Luiz Esteves Seabra. Todos os que passaram por aqui deixaram a marca de seus trabalhos, o carisma de suas vocações, cada um dando sua contribuição para o crescimento de cada paroquiano. A comunidade é profundamente agradecida a Deus por cada um que nos ajudou a caminhar cada vez mais em direção a Cristo e aos irmãos. Nossa Igreja sempre procurou caminhar em comunhão com a Forania, esteve sempre presente no projeto Construir a Esperança. Foi representada na primeira Assembleia do Povo de Deus. Com a direção do COMIPA. Preparou-se por mais de um ano para o CONLA5. As famílias abriram suas casas para abrigar 30 congressistas, dentre eles cinco Bispos. Nestes últimos três anos, recebemos com carinho o Caminho Novo, uma novidade que, para algumas pessoas, é difícil de entender. Eles chegaram com muita humildade, procurando conhecer a história da nossa caminhada, valorizando e respeitando a mesma. Aos poucos, foram revelando qual seria o objetivo maior: construir a unidade. Não temos a capacidade de conhecer os desígnios de Deus, mas nossa querida padroeira francesa faz as portas de sua Igreja se abrirem para acolher esta comunidade nascida sob a luz do Espírito Santo, em sua terra natal. O Caminho Novo, padre Sérgio, padre Philippe e os membros leigos engajados têm nos dado exemplos de como viver a fraternidade, a oração e a contemplação.
Dom Serafim, pedimos a Deus por intercessão de Santa Margarida, que esta visita pastoral, que vossa presença generosa venha marcar uma nova etapa na nossa caminhada de fé. Temos esperança que, a partir deste dia histórico para nós, com a proteção materna da Virgem Maria, começaremos a construir uma Igreja ainda mais participativa, misericordiosa e missionária. Amigo, pedimos que nos abençoe e nos coloque na palma da mão de Deus."
Depoimento cedido em 17/06/2005